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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

A "granfinagem" e o "canelau"

Foto Chico Gomes
Por Luiza Reis

Os velhos carnavais fortalezenses tiveram origem em meados do século XIX a partir do Entrudo de origem portuguesa. Os brincantes atacavam com laranjinhas de borracha, cera com água de cheiro, farinha de trigo, pós de sapato, etc. João Nogueira escreveu em seu livro de memórias sobre essa prática carnavalesca, apontando-a como grosseira e de mau gosto.

O uso de máscaras era um elemento constante no Entrudo cearense. Os Papangus, vestidos de camisolões ou dominós, davam o tom dos festejos que precediam a Quaresma. Eles saiam pelas ruas em grupos perguntando: “Você me conhece?”. No final do século XIX apareceram os bailes das Sociedades Carnavalescas. João Brígido aponta que o primeiro deles foi o Cavaleiros do Prazer, surgida em 1882.

Outras Sociedades também apareceram nesse período: Dragões de Averno, Cavaleiros da Época, Legião dos Únicos e Conspiradores Infernais. Eles brincavam em clubes como o Iracema e o Cearense. Essas Sociedades eram marcadas pela disputa gerada no ápice da ostentação da elite.

No período do carnaval, as distinções sociais diminuíam, mas ainda assim existem relatos de segmentação de grupos nas ruas. Edigar de Alencar, por exemplo, indica as disposições das classes sociais na curtição da festa. Enquanto que a “arraia miúda”, o “canelau” se divertia bem mais folgadamente, nas alas externas, principalmente na da Rua Major Facundo, a “granfinagem” se comprimia no aperto do jardim central.

Ao contrário que era anunciado em narrativas do período, eram raras as brigas e confusões surgidas quase sempre não no local das classes menos favorecidas, mas no centro da folia, onde se divertiam a classe média e a “mais requintada”.

Maracatu

Outra prática que aparece no período do carnaval como forma de resistência negra e que perdura até os dias de hoje é o maracatu. Essa manifestação popular, proveniente dos escravos bantos, foi muito criticada nos veículos de comunicação da época, chamadas de “grotesco” e “apavoradores”.

No entanto, as pessoas não deixavam de participar dos cortejos ao som de múltiplos instrumentos como surdos, bumbos, ganzás e maracás. O maracatu causava sentimentos dúbios entre os participantes no período do carnaval, pois a mesma música que causava alegria aos brincantes era motivo de alerta para as crianças medrosas. O escritor Gustavo Barroso, por exemplo, em seus tempos de menino, quando encontrava os cortejos ao som dos batuques e maracás, corria para se esconder até não ouvir mais o som.

No período do carnaval os moradores das zonas periféricas também faziam os sambas de areia. De acordo com Câmara Cascudo, samba é um nome angolano e teve sua ampliação e vulgarização no Brasil, representando um baile popular de caráter urbano ou rural. No Ceará, o termo samba não se restringia a um gênero musical, mas também à farra ou coletivo de musicalidades nordestinas.

Além disso, teria origem em antigos batuques ou danças de roda, com um solista no meio, incluindo-se aí a umbigada, ou seja, a batida com o umbigo nas danças de roda, como um convite intimatório para substituir o dançarino solista.

Marchinhas

No início do século XX surgem as marchinhas carnavalescas com influência do foxtrot americano. Silva Novo e Pierre Luz fizeram inúmeras parcerias, compondo para o carnaval do Clube Iracema do ano de 1925 “A Gargalhada”, marchinha com letra irreverente: “Viva a folia/ Ave alegria/ Salve o prazer/ Que nos vem da gargalhada/Ou de um sorriso de mulher!/ Cante... Dance.../ Mulher faceira/ A existência é passageira/Haja aventura/ Riso e loucura!/ No carnaval/ (...) Toda cearense/Domina e vence/Pelo sorriso/Que nos traz ao pensamento/Evocações do paraíso.”

No carnaval dos anos 40 surgiu o cordão das “coca-colas”. Segundo Marciano Lopes, ele foi criado logo após a guerra por um grupo de Sargentos da Aeronáutica, como uma brincadeira em cima das moças que namoravam os soldados americanos. Essas moças eram alvos de críticas das famílias mais conservadoras, pois não se fechavam nos preceitos da moral e dos bons costumes propagados no período.

De lá pra cá as festas foram sendo modificadas, surgiram outras brincadeiras e os velhos carnavais ficaram apenas na memória dos habitantes mais antigos de Fortaleza.

http://www.opovo.com.br/app/opovo/vidaearte/2014/02/11/noticiasjornalvidaearte,3204658/a-granfinagem-e-o-canelau.shtml

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