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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Américo Barreira: 100 anos de humanismo

Por Gervásio de Paula

Há muitas teorias que tentam explicar a origem da humanidade. De onde viria essa energia que nos faz humanos. Alguns falam que isso remonta ao nascimento de um redentor, chamado Cristo, nos transformando em pessoas mais generosas, mais amorosas. Há, ainda, quem diga que tudo se explica pelo sistema nervoso central e suas ramificações. Outros afirmam que somos influenciados por astros e estrelas que nos acompanham ao longo da vida e nos tornamos o que somos a partir da posição que esses astros ocupam no cosmos.

Eu pessoalmente, sou adepto do materialismo histórico, que afirma sermos frutos do contexto em que estamos inseridos e das pessoas com as quais cruzamos na nossa vida.
Sou fruto dos muitos homens e das muitas mulheres que me atravessaram ao longo do caminho e do legado que eles me trouxeram. Muito do que sou e do que aprendi se deu no contato com essas pessoas e, sem dúvida, uma das mais emblemáticas é o querido Américo Barreira.

Américo Barreira, um dos maiores municipalistas que esse Estado já teve, se vivo fosse, teria 100 anos.

Ele tinha a sabedoria de quem nasce no frio da serra de Baturité, lugar onde o sopro desce gelado no espírito que verseja. Se apresentava porém com a garra do legítimo sertanejo, que sabe o que vale um pedaço de terra perdido nesse chão de meu Deus. Apesar de caboclo, sua verve intelectual e política se manifestou muito cedo, já escrevia aos 12 anos no jornalzinho, a Farpa, se solidarizando com professores que lutavam contra a ação maléfica dos coronéis no Estado.

Aos 17, já discursava em praça pública contra o então presidente Washington Luis. A palavra o procurava, como diria Manoel de Barros. A luta o procurava. Foi estudante de Direito e colocou sua alma e seu verbo a serviço dos muitos. A serviço dos homens e das mulheres que pereciam da delicadeza e da justeza da vida. Só lhes restavam pessoas de grande humanidade como Américo para defender os povos do sertão da sanha dos coronéis.


Américo foi eleito vereador e com sua eleição se inaugura um novo ciclo de municipalismo no Estado do Ceará. Américo funda a primeira Associação dos Municípios e ajuda a fundar o Partido Comunista. Experimenta a mão pesada da Ditadura Militar (1964-1985) e vive o encarceramento. Mas para homens inventores como Américo, não há cárcere que lhe aprisione o espírito. Suas palavras ecoavam nos que se mantinham nas ruas na luta por novos tempos e seu exemplo tirava o casulo das lagartas, como muitos de nós.

Américo me deu asas e me fez político e humano, no mais essencial que essas duas palavras me podem cair. Político, por me fazer acreditar que é na polis, na cidade, no meio das ruas, com as multidões, que se faz história e que se rompe o ciclo vicioso das castas sobre os plebeus.


Humano, porque apesar da dureza que o sertão se faz em nossa carne, apesar das rachaduras que o coração leva, ele me fez ver que a amorosidade é que constrói a vida e é na beleza dos que precisam de uma mão amiga é que um sujeito pode se orgulhar de suas memórias. Ele era um homem que não envelhecia, como ele mesmo dizia, tinha compromisso com o futuro.

Manoel de Barros diz que é dois seres: o primeiro é fruto do amor de seus pais João e Alice; o segundo e letral, fruto de uma natureza que pensa por imagens.
Eu me arriscaria a dizer que Américo seria não um, nem dois, mas três seres: o primeiro fruto do amor de seus pais, o segundo de natureza intelectual e o terceiro de natureza coração. Américo era, antes de tudo, um homem de grande coração. Tudo que aprendi sobre humanidade e de como deveríamos valorizar e cuidar das pessoas, devo a ele.

http://diariodonordeste.verdesmares.com.br/cadernos/caderno-3/coluna/gervasio-de-paula-1.133/materia-1.810772

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